Por Lúcio Costa
Estelionato
Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento”, Código Penal.
Ontem (26/05) assisti ao Jornal Nacional (JN) da Rede Globo sobre os áudios de Jucá, Renan e Sarney gravados por Sérgio Machado. Assisti como quem lê ao Diário Oficial, no caso, o diário oficial do golpismo.
A versão da Rede Globo sobre os fatos revela toda a competência desta empresa nas artes da manipulação posto que, a simular ofertar informações em realidade apenas faz por ocultar e/ou ofuscar os fatos.
Boa parte do JN trouxe os áudios acompanhados de fotos Renan, de Sarney, Jucá e Sérgio Machado. Logo após apresentação destes, via de regra, foram feitos comentários pelos apresentadores – entremeados por imagens de Sérgio Moro e de agentes da Policia Federal – em que se realçava como objetivo da trama barrar a Operação Lava Jato.
A demonstrar toda sua competência na arte do embuste a Globo conseguiu trazer ao palco da conspiração o jurista e deputado Wadi Damohus (PT/RJ) bem, como envolver o ex-presidente Lula e a presidenta Dilma.
Aliás, é perfeita a sintonia do JN com auto-intitulado o MBL (Movimento Brasil Livre), entidade criada em 2014 e financiada tanto, por empresas petroleiras americanas dos irmãos Koch quanto, pelo PSDB, PMDB e DEM, que, contra vento e maré, afirmam que a única coisa que sobressai dos áudios é, pasmem, “tanto nos áudios de Jucá, como nos de Calheiros e Sarney, um personagem aparece nos planos para receber proteção do acordão: Lula”.
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Na falcatrua desinformativa perpetrada pelo JN foi ao ar o audio em que Jucá afirma ter tido a Aécio e outros grão tucanos:
Falar com o Tasso, na casa do Tasso. Eunício, o Tasso, o Aécio, o Serra, o Aloysio, o Cássio, o Ricardo Ferraço, que agora virou psdbista histórico. Aí, conversando lá, que é que a gente combinou? Nós temos que estar junto para dar uma saída pro Brasil (inaudível). E, se não estiver, eu disse lá, todo mundo, todos os políticos (inaudível), tão f***, entendeu? Porque (inaudível) disse: ‘Não, TSE, se cassar…’. Eu disse: ‘Aécio, deixa eu te falar uma coisa: se cassar e tiver outra eleição, nem Serra, nenhum político tradicional ganha essa eleição, não. (inaudível) Lula, Joaquim Barbosa… (inaudível) Porque na hora dos debates, vão perguntar: ‘Você vai fazer reforma da previdência?’ O que que que tu vai responder? Que vou! Tu acha que ganha eleição dizendo que vai reduzir aposentadoria das pessoas? Quem vai ganhar é quem fizer maior bravata. E depois, não governa, porque a bravata, vai ficar refém da bravata, nunca vai ter base partidária…’ (inaudível) Esqueça!
No entanto, tal informação não mereceu sequer um comentário, pois logo após uma enxurrada de variados repórteres, de formas e ângulos distintos, tratou de limitar o foco informativo ao tema da continuidade Lava Jato.
Na busca desesperada por ocultar a autopsia do golpe realizada pelos áudios, ao encerramento da matéria do JN, depois de inúmeras referências a Lava Jato e as delações premiadas um causídico foi escalado para sentenciar: “os que votaram pela admissibilidade do impeachment sequer conheciam esses áudios”.
Em síntese, para o JN houve somente uma conspiração de alguns políticos para impedir a Lava Jato, mas isso foi felizmente evitado. Assim, em troca da crueza dos fatos relevada pelas gravações dos conspiradores foi ofertada aos telespectadores (as) a afirmação tranquilizadora que a Lava Jato seguirá adiante.
O JN tentou com uma cortina de ruídos e imagens impedir que se percebesse o sentido e racionalidade do afastamento de Dilma: o impeachment foi feito para livrar a uns do risco de irem para trás das grades e, permitir a outros que assaltassem ao governo para pôr em prática um programa paleo liberal e entreguista já derrotado em 04 eleições presidenciais.
A perpetração do estelionato informativo por parte da Globo lançou mão da combinação de dois expedientes de um lado, o recorte temporal dos fatos e, de outro lado, a seleção das informações ofertadas aos telespectadores (as).
Através do primeiro destes recursos se logrou isolar as declarações anteriores de Jucá e Sérgio Machado das afirmações de Renan e Sarney. O ex-ministro de Temer, Romero Jucá, havia dito, recordemos:
- Tem que ter impeachment. Não tem saída.
- Tem que resolver essa porra. Tem que mudar o governo para estancar essa sangria;
- Caiu (Caiu a ficha sobre as investigações chegarem até o PSDB). Todos eles. Aloysio [Nunes, senador], [o hoje ministro José] Serra, Aécio [Neves, senador].
- Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem ‘ó, só tem condições de [inaudível] sem ela [Dilma]. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca’. Entendeu? Então… Estou conversando com os generais, comandantes militares..
Não casualmente, posto que tornaria evidente a conspiração, foi omitida qualquer referência ao fato de que as conversas de Sérgio Machado com Renan e Sarney se deram por orientação de Jucá e com vistas a com estes acordar as formas de execução do golpe. Veja-se:
Eu acho que você deve procurar o [ex-senador do PMDB José] Sarney, deve falar com o Renan, depois que você falar com os dois, colhe as coisas todas, e aí vamos falar nós dois do que você achou e o que eles ponderaram pra gente conversar.
Igualmente, através da seleção de informações, o JN suprimiu da cobertura jornalística a declaração de Sarney de que Renan teria logrado o apoio do PSDB a Michel Temer mediante a oferta de certas garantias deste aos tucanos – presumivelmente o compromisso com a não tentativa de reeleição do usurpador Temer acrescida à garantia da aplicação do programa privatista e entreguista do tucanato.
O roteiro servido no JN foi feito sob na medida do necessário para ocultar uma conspiração levada adiante por uma quadrilha legislativa que, graças a cumplicidade do STF e da PGR – que já conheciam o conteúdo das gravações vindas a público nos últimos dias tempos antes da aprovação do afastamento -, logrou afastar a presidenta Dilma.
Assim, o JN praticou um estelionato informativo destinado tanto, a reconfortar a população dado o asco provocado pela revelação da vergonhosa tramoia que deu origem ao impeachment quanto, a buscar manter às sombras o conluio através do qual a Casa Grande tanto, se esforça por livrar seus filhos diletos do risco das grades quanto, busca destruir os direitos sociais e trabalhistas consagrados pela Constituição de 1988.
É impressionante a capacidade da Rede Globo em vender gato por lebre. Fosse em seara penal, sem dúvida alguma tratar-se-ia de um evidente caso de estelionato.
É de confessar: é fantástico!