Bayer compra Monsanto e cria maior grupo de agrotóxicos
e transgênicos
Após meses de negociações, o grupo farmacêutico e químico alemão Bayer anunciou nesta quarta-feira (14) que acertou a compra da empresa agroquímica americana Monsanto por 66 bilhões de dólares. Se autorizado pelas autoridades antitruste, o negócio criará a maior fabricante de herbicidas e sementes do mundo.
Segundo o jornal The Wall Street Journal, juntas, a Bayer e a Monsanto controlariam 28% das vendas de herbicidas. Elas também seriam fortes no mercado de sementes de cereais e de soja nos Estados Unidos. Juntos, Bayer e Monsanto se converterão em um gigante mundial de 23 bilhões de euros (25,8 bilhões de dólares) de volume de negócios anual, com 140.000 funcionários.
As negociações entre a Bayer e a Monsanto começaram em março deste ano. A primeira oferta do grupo alemão, de 122 dólares por ação, foi apresentada em maio. As distintas ofertas feitas pela Bayer desde maio, cada vez mais elevadas, haviam sido até então rejeitadas pelo grupo americano, que se mostrava aberto a negociar, mas sempre deixando claro que havia outras propostas sobre a mesa. Só que esses misteriosos interessados jamais se revelaram. O acordo foi fechado depois de a Bayer aumentar sua oferta pela terceira vez. O grupo alemão pagará 128 dólares por ação, um pouco mais do que a proposta anterior, de 127,50 dólares por ação.
“Matrimônio dos infernos”
Segundo a AFP, a união das duas empresas está sendo classificada como “matrimônio dos infernos” por ambientalistas e causou fortes críticas na Alemanha, um país cuja sociedade se opõe majoritariamente aos transgênicos.
A Monsanto é a líder mundial em herbicidas e sementes transgênicas e a fabricante do controverso herbicida glifosato, criticado por ambientalistas, médicos e cientistas e contra o qual há cada vez mais evidências de causar câncer.
Existe até um Dia Mundial contra a Monsanto, algo sem precedentes na relação entre empresas e a sociedade. Em 2015, ele aconteceu em 23 de abril e mobilizou pessoas nos 5 continentes, em 48 países e 421 cidades. Este ano os protestos globais acontecerão em 16 de outubro –há um site global que orienta a mobilização e dissemina conteúdos de denúncia conta a Monsanto: http://www.march-against-monsanto.com.
Veja imagens de protestos contra a empresa em Portugal e na Argentina:
Além disso, a empresa é alvo de campanhas seguidas movidas por agricultores e ambientalistas. No Brasil, o MST lidera os protestos contra a Monsanto.
Autoridades antitruste
Antes da fusão se consolidar, especialistas antitruste afirmaram que reguladores do mercado nos EUA provavelmente exigirão a venda de algumas licenças de soja, algodão e canola como uma condição para aprovar o acordo.
O fato de a empresa ser forte nos EUA, e a Bayer, na Europa e na Ásia, pode servir como um bom argumento para a aprovação da fusão. No ano passado, a Monsanto tentou adquirir a concorrente suíça Syngenta, que ao final ficou nas mãos de empresários chineses.
Segundo o comunicado da Bayer, a sede da nova gigante no setor de sementes deverá ficar em St. Louis, no estado americano de Missouri.
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Pela Coalizão contra os perigos da Bayer | Tradução: Inês Castilho
O pior dos cenários realizou-se: a Bayer comprou a Monsanto por 66 bilhões de dólares. O fato dá origem ao que é, de longe, a maior corporação de agronegócio do mundo. Segundo os resultados financeiros de 2015, as duas empresas têm um volume de negócios combinado de US$ 23,1 bilhões. Ninguém do ramo pode igualar-se a elas. Os jovens casais Syngenta / ChemChina e Dupont / Dow as seguem de longe (US$ 14,8 e 14,6 bilhões, respectivamente), e a Basf está relegada ao quarto lugar, com US$ 5,8 bilhões.
A Bayer e a Monsanto controlam, juntas, cerca de 25% do mercdo mundial de pesticidas; e de 30% das vendas de sementes agrícolas — tanto as geneticamente modificadas quanto as convencionais. Considerando-se somente as plantas transgênicas (OGM), as duas corporações juntas atingem uma clara posição de monopólio, com mais de 90%.
“Com a aquisição da Monsanto pela Bayer, a concentração no mercado do agronegócio atinge um novo pico. Os elementos chave da cadeia alimentar estão agora nas mãos de um só grupo. Os agricultores devem preparar-se para pagar preços mais altos e também terão menos escolhas. Além disso, deve piorar ainda mais o bloqueio à inovação no setor, especialmente para os herbicidas”, criticou Toni Michelmann, da Coalizão contra os males da Bayer (CBG). A organização de defesa dos consumidores SumOfUs também assumiu posição contra a compra da Monsanto. “Esta aquisição é uma ameaça ao nosso abastecimento de alimentos e a todos os agricultores do mundo”, declarou Anne Isakowitsch. “Não surpreende, portanto, que mais de 500 mil de nossos membros tenham assinado uma petição contra essa compra.”
Michelmann anunciou que a CBG quer aproveitar o Tribunal Monsanto, previsto para outubro, em Haia, para articular-se com as diversas iniciativas contra a Monsanto e redirecionar a partir de agora a resistência, centrando-a sobre a Bayer. A primeira ação coletiva prevista pela coordenação ocorrerá na próxima assembleia geral da multinacional de Leverkusen, no Parque de exposições de Colônia, na Alemanha, em 28 de abril de 2017. “A lista de oradores dificilmente se esgotará num só dia. A Bayer pode, por precaução, reservar também o dia 29 de abril”, recomenda Michelmann à corporação global. Ele mencionou ainda uma “Marcha contra a Bayer”, que será dirigida a Leverkusen.
“O grupo pode esperar desde já o aumento da pressão contra si. Pressão contra uma política comercial que finge lutar contra a fome, mas aposta sobretudo nas monoculturas de soja e de milho para alimentar a pecuária industrial e que, com seus pesticidas, coloca em perigo polinizadores como as abelhas, tão importantes para as culturas aráveis . Uma política comercial que se baseia em tecnologias de risco como manipulações genéticas, uma política que, ao invés de buscar alternativas, leva mais e mais venenos para o campo”, afirma o químico.
Segundo a Coalizão, os políticos devem agir. E não é possível contentar-se com procedimentos cosméticos por parte da Comissão Europeia para a Concorrência. Não bastam pequenas medidas, como separar-se do setor algodoeiro ou livrar-se de certos pesticidas, especialmente porque a Basf já está de olho nesse tipo de produto. Os políticos devem também levar em conta o impacto sobre o emprego e o regime fiscal. Não é possível que a Bayer obtenha deduções fiscais para essa aquisição, e as cidades onde se encontram suas indústrias fiquem numa penúria ainda maior. Também é excluída desde já qualquer tentativa, por parte da empresa, de reduzir a dívida contraída pela operação de compra com o corte de empregos e medidas de reengenharia.
Axel Köhler-Schnura, da CBG, conclui:
“A cínica partida de pôquer em torno da Monsanto, animada por pura cupidez, mostra mais uma vez que a alimentação do mundo é uma questão séria demais para ser deixada nas mãos dos gigantes do agronegócio. O que a Coalizão contra os males da Bayer recomenda, portanto, é colocar as corporações sob controle social.”