Por Beto Bastos*
De pronto afirmo que sim. Minha reflexão é para quem parte dessa premissa, e não aqueles que, por várias razões, saíram do partido em outros momentos menos explosivo que o atual. Para esses o PT acabou faz tempo, logo, qualquer pedra no meio do caminho vislumbram uma montanha. Antes de analisar o resultado do Diretório Nacional que apresentou mudanças no processo partidário, avalio ser mais importante entender o momento político pelo qual passamos e o peso que a Política terá nesse processo.
Tenho total acordo com a ideia que se esgotou um ciclo da esquerda brasileira. Um ciclo iniciado com o fim da ditadura e a construção do PT, passando nos últimos anos pela sucessão de governos petistas. Estamos agora diante de um novo desafio, a reconstrução da esquerda brasileira frente a enorme derrota com o impeachment da presidenta Dilma. Há nesse processo uma importante questão a ser definida. Qual papel jogará o PT nesse processo, ou se este existirá nessa recomposição. Sem avançar numa ideia mais precisa da conformação dessa nova esquerda, avalio que a velocidade da construção de uma nova alternativa de massas, seja partidária ou de uma frente, precisará de um PT renovado para acelerar o tempo de travessia para uma nova alternativa concreta. É impossível a uma nova esquerda brasileira se firmar sem levar em conta a experiência do petismo, num balanço dos seus inúmeros erros, mas também nos vários acertos de sua trajetória. Numa conjuntura onde se tenta afirmar um estado de exceção a noção de unidade das esquerdas é fundamental e o patrimônio político representado por dezenas de milhares de militantes petistas não pode ser desprezado.
É fundamental nesse processo de disputa partidária que se evite a dispersão em saídas isoladas e aparentemente mais fáceis. Não há saída fácil! Há um único caminho, recompor uma nova hegemonia no PT em cima de um profundo balanço de sua trajetória e a afirmação de um novo funcionamento partidário, recuperando os ideais de um partido socialista, transformador e profundamente democrático. Nesse ambiente de crise, porém com uma muita resistência, em particular por uma nova geração de jovens, não me parece que o PT consiga ficar imune a pressões por uma radical mudança. Aliás, nunca conseguiu. Já vivemos períodos onde a maioria rachou e construímos uma nova hegemonia junto com outros setores. Mais recentemente, na crise do mensalão, só não elegemos o companheiro Raul Pont para a presidência do PT, por conta da saída dos companheiros que apoiaram a candidatura do Plínio de Arruda Sampaio do 2º turno da votação. E isso num PED (Processo de Eleições Diretas) de cabo a rabo num momento em que o partido controlava volumosos recursos.
Não vejo como, na disputa política real – onde um duro balanço será feito e novas propostas organizativas serão apresentadas para rearrumar o PT – que a antiga maioria consiga construir um discurso que a recomponha para o embate. Como o PT nunca foi imune às pressões sociais, elas agora virão não só da esquerda partidária e de setores da atual maioria, mas virá também com muita força dos movimentos sociais que entendem a necessidade de um PT renovado para repor a esquerda num novo ciclo de crescimento. A política é favorável à esquerda partidária nesse processo.
Claro que para além do conteúdo a forma da disputa é importante e não pode ser negligenciada. Aí entro na resolução aprovada no DN de renovação das direções por Congresso, mas iniciada nos municípios pelo antigo processo de PED com urna aberta. Vários se apressam em afirmar que nada mudou e que prevaleceu a posição da burocracia partidária que se encontra em maioria. Uma leitura superficial. A mudança, embora não a ideal, é bastante significativa. É necessário enxergar os dois processos e entender a diferença. No modelo antigo tudo se iniciava e terminava no PED municipal. Ali se votava em urna aberta ao longo de um dia e definia o conjunto das novas direções e presidentes municipais, estaduais e nacional. Agora o PED municipal continua a eleger a sua direção e presidente, mas elege delegados para um Congresso Estadual, no qual são eleitos a nova direção e presidente regional e é definida uma delegação proporcional para a etapa nacional, onde se elege a nova direção e presidente nacional. É muito diferente, não há como afirmar que se trata da mesma coisa. No primeiro caso não há embate, construção de posições e contraditório, as direções são eleitas a frio. Agora há debate congressual! Quem vivenciou o período de grandes debates partidários em Congresso sabe o peso que eles têm. Muitas vezes começa de um jeito, mas em função do calor do debate, acaba de forma totalmente diferente. Relembro, já refizemos maioria partidária em processo desse tipo.
Alguns camaradas argumentam que, com o processo municipal com urna aberta, isso contamina o processo até o final. Claro que não é o ideal, mas, de qualquer forma, tanto num processo de PED municipal como o de encontro municipal com votação somente ao final de um debate político (proposta que defendemos e foi derrotada), a base de filiados é a mesma. Aí voltamos novamente à política. Mesmo com um processo de pouco debate numa conjuntura como a que estamos mergulhados, com o partido enfraquecido e baixíssimos recursos disponíveis, é razoável imaginar que é um campo mais favorável para uma disputa à esquerda? Um dado bem objetivo: no recente Congresso de Salvador, com uma representação eleita com mais de 2 anos de antecedência a partir de um PED onde o PT ainda governava o Brasil, o campo político que reúne as forças que compõem o Muda PT eram 40% daquela delegação e, a depender de algumas votações, nós chegamos a bater 45%… 45%! O que pode nos levar a acreditar que a situação agora é pior? Não é. A maioria está dividida e … falida! Mais ainda, não há interesses em partidos “estranhos” em dar uma “ajudinha” agora que não somos mais governo. Soma-se a isso uma centena de filiados que tinham esquemas de filiações saíram do PT e não tem mais nenhum interesse nessa disputa.
O quadro mudou. Maiorias partidárias em crise têm duas reações. Se fecham para não permitir qualquer mudança, como ocorreu no Congresso de Salvador, mas para isso precisam ter alguma força e unidade para operar um resquício de política; ou, para evitar uma eminente derrota negociar uma saída. É o que estamos vivendo, e o Lula começou a operar uma saída com a esquerda do PT. É só reparar que na resolução aprovada quem mais cede e sai perdendo é a CNB, e não podemos transformar esse momento numa derrota da esquerda.
Vivíamos um grande dilema. Apresentava-se uma bifurcação. Imaginava-se que a CNB conseguiria impor um processo tradicional de PED de cima abaixo. Nesse caso era razoável se pensar em uma nova alternativa, mas não foi isso que aconteceu. Houve uma derrota desse setor. Agora só resta um único caminho, o da disputa. Temos 4 meses até o Congresso de Abril para organizarmos nossas forças e ir para um duro embate. Não é hora de chorumes, no momento precisamos de um direcionamento político firme que aponte para uma disputa do legado do PT. A vitória não será fácil, mas é possível, para tanto é hora de aprumar nossas forças num único sentido. Não nos cabe outra alternativa, vamos disputar para construir uma nova síntese partidária com o PT … sob nova Direção!
*Beto Bastos é engenheiro, membro do PT do Rio de Janeiro e da Coordenação Nacional da Democracia Socialista.
Fonte: Beto Bastos